PS e Bloco ameaçam levar nova lei dos baldios ao Constitucional


Oposição alega que diploma da direita abre a porta à privatização dos baldios. Maioria defende que quer criar regras para um sector que hoje não as tem - ou não as cumpre.

O PS e o Bloco de Esquerda ameaçaram esta quarta-feira levar a questão dos baldios ao Tribunal Constitucional caso seja aprovada a proposta da maioria PSD/CDS-PP que prevê mudanças na forma como são geridos aqueles terrenos e que criam mecanismos de fiscalização da sua actividade.

A oposição acusa a maioria e o Governo de estarem a preparar a “privatização” dos baldios – terrenos possuídos e geridos por comunidades locais - ao lançarem um projecto de lei que prevê, entre outras questões, que passem a poder ser compartes dos baldios todos os moradores das freguesias onde estes se localizem, que as receitas geradas por estas propriedades tenham que ser aplicadas na gestão das mesmas, que passem a existir contas públicas anuais fiscalizadas pela Autoridade Aduaneira, que os terrenos sejam inscritos na matriz predial para actualização do cadastro.

Apesar desta “oficialização” também perante as Finanças, PSD e CDS-PP defendem que se mantenham as isenções fiscais como o IMI, IRC e IVA, garantiu o deputado Pedro do Ó Ramos durante a discussão do projecto. O social-democrata argumentou que as contas que muitos baldios fazem actualmente “não são transparentes nem públicas”, que muitos benefícios são usados pelos compartes e não nas propriedades e que existem muitos “arrendamentos encapotados para as eólicas”. Existirão entre 400 a 500 mil hectares de baldios em Portugal.

Em resposta à iniciativa da direita, o Bloco apresentou um projecto de lei que retira os baldios da Bolsa de Terras aprovada em 2012, por esta desrespeitar a “natureza de bem comunitário” daqueles terrenos. O bloquista Luís Fazenda veio admitir que a lei dos baldios “merece uma modernização” – mas não assim, insistindo que a proposta da maioria “representa a privatização dos baldios, o que é inconstitucional”.

Fazenda lembrou Aquilino Ribeiro para dizer que “continuam a existir lobos que uivam à volta dos baldios”, numa referência à polémica decisão do Estado Novo, nos anos 40, de expulsar os beirões que sempre amanharam aqueles terrenos para os usar para plantar árvores. “Juntaremos força com quem quer que seja para tentar obstar à falta de legitimidade constitucional deste diploma”, assegurou Fazenda, que recebeu o primeiro “presente!” da bancada do PS.

Dúvidas constitucionais
O socialista Miguel Freitas afirmou que o projecto “está repleto de dúvidas constitucionais” por questionar o conceito e o direito das comunidades locais e os usos e costumes, por atacar as competências soberanas das assembleias de compartes e por retirar ao Ministério Público a possibilidade de intervir na propriedade comunitária.
O parlamentar do PS apontou o desconhecimento dos deputados da maioria acerca da realidade no terreno por os autores do diploma serem maioritariamente do Sul do país e os baldios estarem maioritariamente a Norte. Miguel Freitas reconheceu a necessidade de melhorar a “gestão activa e a transparência dos baldios” mas defendeu que a proposta PSD/CDS-PP lançará a confusão e criará uma “guerra da desanexação dos baldios”.

O deputado centrista Abel Baptista veio responder identificando-se como "comparte de um baldio em Ponte de Lima" e realçou que “não há [no diploma] uma única palavra no sentido da privatização dos baldios” – a mesma ideia foi depois corroborada pelo secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, Francisco Gomes da Silva. Mas Abel Baptista garantiu a abertura da maioria para incorporar propostas da oposição na discussão na especialidade. Os sociais-democratas realçaram depois que a actual lei já permite a alienação dos baldios.

Para esta quinta-feira está marcada uma manifestação em Lisboa dinamizada pela Federação Nacional dos Baldios e pela Confederação Nacional de Agricultura (CNA). Os diplomas do PSD/CDS-PP e do Bloco serão votados na sexta-feira.

Fonte: Público, Maria Lopes 02/04/2014

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